segunda-feira, 1 de agosto de 2016

Sobreposição de eventos culturais!? Qual é o problema?


wpid-icon-ze-abreu.png
Numa ilha que acolhe tantos agentes e associações culturais, desportivas e sociais, tantas empresas de criação de eventos, entre outros géneros de associações, todos a realizar – e ainda bem que o fazem – iniciativas culturais, desportivas e de entretenimento, torna na realidade, simplesmente, impossível não haver sobreposições de eventos.


Em boa verdade, sempre fomos uma terra abençoada por muitas festas, festinhas e festarolas. Passámos o ano, presenteados com uma alargada oferta de eventos, – com mais ou com menos brio e por vezes inspirados uns nos outros – desde semanas gastronómicas, festivais, arraiais, encontros, festas comemorativas dos respetivos concelhos, noites de verão e festas de cariz religioso que cada vez mais são recheadas com componentes de animação cultural, algumas mesmo, com artistas de elite na sua programação.
Depois, ainda há os super inspirados ou iluminados, que criam eventos para tudo e sobre tudo, desde o dia disto, ao dia daquilo. Também, para gáudio de todos, não nos falta os concertos com as mais diferentes conceções e estilos musicais ou espetáculos de outras artes performativas. O mesmo acontece com os desfiles, lançamentos de livros e exposições.
Perante este cenário, julgo ser impossível evitar as sobreposições na programação de eventos, visto que são muitos a organizar – 11 municípios, 54 freguesias, 40 casas do povo, entre outras largas dezenas de associações – e todos procuram realizar os eventos, focalizados, nos fins de semana, mas como sabemos um ano só tem, aproximadamente, 52 fins de semana, o que não chega para tanta festividade.
Acrescenta-se ainda os eventos culturais organizados pelo setor público, nomeadamente, os projetos no âmbito dos “Festivais Culturais da Madeira”, a temporada artística da Direção de Serviços de Educação Artística e Multimédia, a temporada do Conservatório – Escola das Artes – Eng.º Luíz Peter Clode e de outras tantas programações de eventos da responsabilidade de organismos governamentais e demais associações culturais e artísticas.
Só para ficarmos com uma ideia mais real sobre a sobreposição de eventos na nossa região, e a título de mero exemplo, no pretérito fim de semana de 17, 18 de julho, na Madeira, tivemos entre outros, esta sobrecarga de eventos: Expo Madeira; Festival Raízes do Atlântico; XV Mostra Regional da Banana; XI Festa da Lapa; Xutos & Pontapés no Parque de Santa Catarina; Comemoração do dia da Freguesia de São Pedro com diversas atividades artísticas; Orquestra de Bandolins de Câmara de Lobos, apresentou um concerto no miradouro do Cabo Girão; Marco Paulo atuou na “Mostra Gastronómica de Santana; XX Encontro de Folclore de Santa Cruz; A Escola Básica e Secundária da Calheta, realizou a XIV edição do Festival da Canção Interescolar ‘Talentos à Solta’; O bailado burlesco russo ‘Petrouschka’, levado ao palco no Centro de Congressos do Casino, numa produção da Escola de Bailado Carlos Fernandes; Concerto encerramento da temporada artística da Orquestra Clássica da Madeira no Teatro Municipal Baltazar Dias; A Junta de Freguesia de Boa Ventura organizou o II evento “Música nas Ruínas”, no Antigo Engenho, Caminho da Entrosa, Calhau da Boa Ventura.
Bom, quer dizer, mau, já me perdi com tamanha oferta de eventos. E tudo isto, sem se contabilizar algumas atuções nos mais diversos espaços comerciais e os eventos desportivos, nas mais variadas modalidades.
Mas o mais espetacular é que com tanta sobreposição de eventos, ainda assistimos a balanços, com resultados muito positivos, na sua grande maioria, por parte dos organizadores, que apresentam os resultados como: “muito positivo”, “grande sucesso “, “êxito” “enchente”, “excelente afluência de público”, “ casa cheia”, “superou as expetativas”, “… ao rubro”. É caso para dizer: com tanto sucesso e satisfação, viva a sobreposição de eventos! Pois afinal, pelo que parece, temos mesmo público para tudo. O que de certa forma contradiz, em parte, algumas das conclusões que constam do estudo” “Três Décadas de Portugal Europeu – Balanço e Perspetivas ”, onde se afirma que os portugueses aparecem com uma certa reserva na participação cultural e lazer em relação aos outros cidadãos europeus.
Este estudo, coordenado pelo economista Augusto Mateus e encomendado pela Fundação Francisco Manuel dos Santos, mostra que, entre 1999 e 2013, Portugal foi o país europeu em que a relevância dos gastos com cultura e lazer mais decaiu. Vale mesmo a pena uma leitura atenta a este documento, que pode ser consultado em: https://www.ffms.pt/upload/docs/PortEuroUmBal3Dec.pdf
Mas cá para nós, o pior, seria mesmo não existir oferta cultural. Mas já que existe e em fartura, vamos lá desfrutar. A escolha será sempre uma questão de opção, por parte dos fruidores dos eventos. O público é que tem sempre a última palavra, acorre aos eventos que mais lhe convém em determinado momento e local.
Mesmo que se criasse uma plataforma online onde as coletividades tivessem a possibilidade de colocar a programação das iniciativas a realizar, haveria sempre sobreposições de eventos, tendo em consideração a quantidade dos mesmos e os respetivos programas a cumprir de forma a justificar os compromissos e os necessários apoios e subsídios, para o normal funcionamento das associações.
No entanto, há que promover a reflexão e o debate alargado em torno da agenda de eventos que se realizam na Região Autónoma da Madeira, para que se possa contribuir para uma melhor promoção cultural, turística e económica.
Os eventos fazem parte da nossa cultura. E como a cultura é uma arte do encontro de percursos e conceitos diferentes e de cidadania no seu mais vasto e nobre sentido, vamos continuar felizes a criar, a partilhar e a conviver com os nossos eventos.
2016-08-01 | Zé Abreu

Sem comentários:

Enviar um comentário