segunda-feira, 16 de julho de 2018

O Teatro como Disciplina de Educação Artística



Julgo que ninguém tem dúvidas que a educação através da arte é imprescindível para a formação integral das crianças e jovens, bem como para o exercício de uma cidadania plena. Assim já atuavam os gregos da antiguidade que deram às artes um papel de destaque na educação. A educação artística, como defende Alberto B. Sousa (2003), “proporciona uma equilibrada cultura geral, com vivências culturais no domínio das letras, das ciências e das artes, que levará a um melhor desenvolvimento da pessoa, no seu todo”.
Por isto, é que o Teatro como disciplina de educação artística, desempenha um papel importante na educação, uma vez que trabalha diferentes expressões: corporal, vocal, musical, escrita e plástica. E, obviamente, ajuda os alunos a desenvolverem competências nos domínios cognitivos, emocional, afetivo, pessoal, social, artístico e cultural. Também os alunos envolvidos num processo de Teatro-educação desenvolvem a confiança em si e nos outros, a capacidade de trabalhar em equipa, de desenvolver a oratória, a concentração, a memória, a dicção, a leitura e compreensão de textos (dramáticos, poéticos, contos, etc.), a respiração, a projeção, o estar em público, o falar em público, a criatividade, a capacidade de abstração, a escrita dramática criativa, o sentido estético e a aprendizagem dos códigos teatrais.
Mas em Portugal, infelizmente, verifica-se um desinvestimento do Teatro na educação por culpa dos vários governos de diferentes partidos. E isso é preocupante quando se fala cada vez mais na importância de trabalharmos a criatividade junto dos nossos alunos. Nas palavras de Sir Ken Robison “a escola mata a criatividade”. Interpreto estas palavras, quando a escola não oferece às crianças e aos jovens a oportunidade de terem uma experiência enriquecedora no universo da educação artística.
Numa época em que as crianças e jovens cada vez mais estão “reféns” das novas tecnologias, uma disciplina como o Teatro é um caminho para uma melhor socialização, para uma melhor aprendizagem individual e coletiva através da conceção de projetos de artes performativas dentro e fora da escola.
Pois apostar no Teatro na escola é apostar numa educação para a cidadania, com vivências diversificadas e num currículo que se deseja relevante e que estimule os diferentes tipos de conhecimento e formas de aprender. Ter uma experiência no Teatro-educação é ter consciência pedagógica e abertura para o mundo artístico que impele para a inovação. Nesta linha de pensamento está Peter Brook, ao afirmar que: “ O teatro é, para aquele que o faz, um exercício permanente. Representar, aceitar o desafio do jogo, é, assim, aceitar melhorar-se através do prazer, o que faz do teatro um instrumento fantástico da educação.”
Fazendo um enquadramento da educação artística na escola atual, com a introdução do Teatro/expressão dramática como disciplina curricular do Sistema Educativo Português, detetamos facilmente que a inclusão do Teatro na escola portuguesa tem sido feita de forma lenta e pouco sistemática.
Se repararmos, no 1.º Ciclo do Ensino Básico, a Expressão Dramática faz parte do currículo, mas é essencialmente desenvolvida no âmbito de Atividades de Enriquecimento Curricular ou com as expressões integradas.
No 2.º ciclo do Ensino Básico, não existe qualquer disciplina com ligação ao Teatro. No 3.º ciclo, existe a Oficina de Teatro, somente no 7.º e 8.ºanos, como opção de escola.

No Ensino Secundário, até já existiu a disciplina de Oficina de Expressão Dramática, mas entretanto terminou. No ensino profissional, existem cursos de Teatro em poucas escolas. No entanto, como sabemos no nosso país existe várias instituições de ensino superior que oferecem cursos no campo das artes do espetáculo, então porque não existir um curso de artes do espetáculo no ensino secundário, dirigido a alunos que quisessem seguir estudos superiores na área artística?
O Teatro ao serviço da educação dá ao estudante o ensejo de valorizar-se, de integrar-se harmoniosamente no grupo, aumentando o senso de responsabilidade e o sucesso do trabalho. “Não há dúvida que o teatro pode ser um sitio muito especial” (Brook, 2008, p. 139) e a escola é certamente um sítio muito especial, para o florescimento do Teatro-educação.
Ainda à volta da implementação do Teatro na educação em Portugal, mais recentemente, no ano letivo 2012-2013 foi lançada uma discussão pública sobre a educação artística no currículo e sem se conhecer os vários contributos individuais e coletivos, avançou-se, logo com uma nova revisão curricular - Decreto-Lei n.º 139/2012, de 5 de julho -, onde se constata logo que a educação artística diminuiu a sua presença no currículo, nomeadamente no que diz respeito à disciplina de Teatro.
A verdade é que no currículo anterior os alunos do 7.º e 8.º ano tinham, semestralmente, apenas duas disciplinas de educação artística: Educação visual e outra a definir por cada escola (Teatro, Dança, Música, etc.) e no 9.º ano, podiam ter, anualmente, apenas uma disciplina de educação artística: Educação Visual ou Educação Tecnológica ou oferta de escola. Já com a entrada em vigor do novo Decreto-Lei n.º 139/2012 a disciplina de oferta de escola passou a ser de natureza artística ou tecnológica e deixou de existir – lamentavelmente – no 9.º ano. Não se compreende como é que em pleno século XXI os alunos de 9.º ano, por exemplo, não podem frequentar mais do que uma disciplina de educação artística, nem possam ter a opção de escolha de uma área artística, que vá mais ao encontro dos seus gostos.
É com muita mágoa que vejo que pouquíssimas escolas no nosso país disponibilizam aos seus alunos a disciplina de Teatro. No caso da Madeira, só a Escola Básica e Secundária da Ponta do Sol oferece aos alunos a opção da disciplina de Teatro. 
Bendita a hora que o conselho pedagógico da Escola Básica e Secundária da Ponta do Sol deliberou oferecer a opção de Teatro como disciplina de educação artística para o 3º ciclo do ensino básico a parir do ano letivo 2003-2004. É de salientar que esta escola foi pioneira - e atualmente única -, na ilha da Madeira a ter o Teatro como disciplina de educação artística.
Assim, muitas crianças e jovens têm viajado como artenautas pelo mundo do Teatro; fazendo desta arte um complemento essencial na sua formação pessoal, artística e cultural.
Legalmente, qualquer escola do 3.º ciclo, de acordo com o seu projeto educativo pode oferecer o Teatro como disciplina de educação artística aos alunos dos 7.ºs e 8.ºs anos.
Falta uma aposta clara e consistente nesta área artística. E não têm faltado estudos, eventos, que abonam em prol das artes na educação: Como a I Conferência Mundial sobre Educação Artística, organizada pela UNESCO, que aconteceu de 6 a 9 de Março de 2006 no Centro Cultural de Belém em Lisboa, surgiu o Roteiro para a Educação Artística, onde “propõe-se explorar o papel da Educação Artística na satisfação da criatividade e de consciência cultural no século XXI, especialmente sobre as estratégias necessárias à introdução ou promoção da Educação Artística no contexto de aprendizagem”. Na Madeira realiza-se anualmente um congresso de educação artística, organizado pela Direção de Serviços de Educação Artística e Multimédia que tem realçado a importância da educação artística como um lugar central e permanente em todo o currículo. O que tem faltado realmente é a vontade política.
Oxalá que os nossos decisores políticos entendam, de uma vez por todas, que a educação artística, nomeadamente o Teatro, é uma área de grande interesse pedagógico que promove o desenvolvimento integral e harmonioso dos alunos em todo o sistema educativo.
É urgente o teatro na escola. Tal como escreveu Redondo Júnior, estamos seguros que “A juventude pode salvar o teatro“, mas para que isso seja uma realidade é imprescindível criar-se no sistema educativo português, um grupo de recrutamento para a disciplina de Teatro. Porque sem professores com uma formação sólida na área teatral, jamais podemos falar no sucesso educativo através da arte. Insisto: Para quando o grupo disciplinar de Teatro? Deram-nos um número, o 900, que vale, nada! Enquanto não houver um verdadeiro “olhar pedagógico-artístico-cultural” e vontade política para se criar um grupo disciplinar de Teatro ou no mínimo criar e integrar o Teatro num grupo de artes performativas, ou de expressões artísticas, por exemplo, o Teatro como disciplina de Educação artística será sempre um parente pobre da educação artística em Portugal.
O Teatro-educação não tem como objetivo a formação de artistas, mas sim desenvolver qualidades criativas e estéticas, que contribuam para formar crianças e jovens mais dialogantes e criativos, capazes de aprenderem individualmente e em grupo. O Teatro é uma área artística que constrói conexões entre alunos, escola e comunidade envolvente.
De acordo com João Mota (2008, mencionado em Lopes, R. p. 208), “hoje fala-se mais em estarmos uns com os outros” e realmente no Teatro só é possível desenvolver-se boas práticas se tivermos bem definida esta relação de proximidade do Eu com o Outro.
A grande maioria das crianças e jovens têm os seus primeiros ou únicos contatos com o teatro através da escola. Por isso é que a escola deve ter uma atenção redobrada ao importante papel das artes e da cultura nas sociedades contemporâneas. Por isso, é que não podemos empurrar o Teatro-educação para um canto, mas promove-lo como uma área artística que visa a formação integral do indivíduo.

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